31/08/2011

A gente já andou dando uma pincelada geral em Poder Constituinte por aqui, mas a pedidos resolvemos postar um resumão que pretende ser um material de consulta definitivo. Vamos lá?

Poder Constituinte.

Em linhas regais, pode-se conceituar poder constituinte como o poder que pode criar, modificar e extinguir uma constituição.

Paradigmas históricos:

I – Inglês = é juridicamente impossível um poder constituído criar algo, porquanto a própria sociedade já conquista os seus próprios direitos. O poder constituinte apenas revela o que a sociedade já conquistou. Esse pensamento advém de 1688, com a Revolução Gloriosa, a qual consubstanciou a ideia de supremacia do parlamento. Essa supremacia expressa a ideia de que a sociedade é representada pelo parlamento e se há a representação da sociedade pelo parlamento outro poder não poderia se sobrepor a este.

II – EUA = a ideia de que o parlamento seria subordinado (Supreme Power). Em outras palavras, vigora a ideia de que o parlamento seria limitado pela própria constituição, uma vez que esta limita os poderes constituídos.

III – Francês = como característica desse momento histórico, temos:

- Surgimento da classe burguesa;

- Pensamento do Abade Siyés;

- Surgimento da ideia de poder constituinte, uma vez que este criaria uma nova ordem constitucional, com poderes de romper com a antiga ordem e criar uma nova constitucional, criando um novo Estado, constituindo os novos poderes constituídos. Há, aqui, uma clara subordinação destes poderes para com aquele, uma vez que os poderes constituídos respeitam a constituição criada pelo poder constituinte. Essa ideia é apresentada como Teoria Moderna do Poder Constituinte.

OBS: Para o Abade Siyés há limitação ao poder constituinte, sendo a limitação de direito natural e o seu titular seria a nação. No Brasil, diferentemente, prevalece a ideia de que a limitação é uma limitação de direito e o seu titular é o povo. Com a constituição do poder constituinte há três consequências importantes:

- Um novo Estado;

- Uma nova constituição;

- Uma nova ordem jurídica.

3.1. Titularidade e exercício do Poder Constituinte.

O titular do poder constituinte é sempre o povo e não a nação.

OBS: uma constituição outorgada (sem participação popular) ainda sim é o povo o seu titular, porque se entende que há o consentimento do povo para a elaboração da constituição. Agora, a partir do momento que o povo não mais consentir haverá uma revolução.

OBS: Qual o significado de povo (critérios)?

a – Jurídico = é aquele definido em uma norma. Não serve para definir o titular do poder constituinte.

b – Político = conjunto de pessoas que podem votar. Não é utilizado pelo Brasil.

c – Nacionalidade = é o conjunto de nacionais.

d – Plural = plurissignificativo. É o conjunto de indivíduos e entes dotados ou de personalidade jurídica que podem de alguma forma participar da elaboração de uma nova constituição.

No que atine ao seu exercício, o poder constituinte é dividido da seguinte forma:

I – Outorga = não haverá participação popular na elaboração da constituição.

II – Promulgada = procedimento democrático, com a participação popular. Pode ocorrer de duas formas:

a – Direta = o povo diretamente, sem qualquer intermediário elabora a própria constituição.

b – Indireto = representantes do povo irão elaborar a constituição em seu nome, por meio de um órgão chamado Assembleia Nacional Constituinte. Ex.: Constituição brasileira de 1988.

OBS: o Congresso Nacional, no caso brasileiro, por da Constituição brasileira, exerce tanto as funções de legislador como de Poder Constituinte.

3.2. Tipos de Poder Constituinte.

3.2.1 – Originário (1º grau ou instituidor).

É o poder de criar um novo Estado e uma nova ordem jurídica por meio da elaboração de uma nova constituição.

Qual a sua natureza?

Vai depender do ponto de vista adotado. Há duas correntes:

a – Jusnaturalismo = prega a ideia de um direito natural, de que existe independentemente de qualquer condução legislativa do homem. Existe pelo mero fato de ser humano.

b – Juspositivismo = prega a ideia de que a norma jurídica será elaborada por um órgão investido de competência para tanto. É a corrente adotada pelo Brasil. Sendo assim, o fundamento de validade do poder constituinte originário é o FATO/POLÍTICO/SOCIAL, porquanto não fundamenta a sua validade numa ordem anterior nem posterior. É um poder de FATO/POLÍTICO/SOCIAL.

3.2.1.2. Características do Poder Constituinte Originário:

a – É um poder criador, já que cria um novo Estado, uma nova constituição e uma nova ordem jurídica;

b – É incondicionado, podendo ser exercido de qualquer maneira;

c – É um poder de FATO/POLÍTICO/SOCIAL;

d – É um poder perene, o qual diz respeito a sua titularidade, uma vez que a elaboração de uma nova constituição não extingue o seu titular;

e – É ilimitado juridicamente, não comportando qualquer limitação jurídica. Sendo assim, não há direito adquirido em relação a manifestação do poder constituinte originário. O único tipo de limitação que existe é de cunho social, cultural e de ordem econômica, mas nunca de cunho jurídico. O STF adota, inclusive, essa ideia de limitação.

ATENÇÃO: Há autores que entendem que há limitações ao poder constituinte originário, como Jorge Miranda, por exemplo. Para este autor, as limitações são da seguinte ordem:

I – Imanentes = dizem respeito a atuação do constituinte originário formal;

II – Transcendente = são aquelas que dizem respeito ao direito natural e aos direitos fundamentais. Não pode subtrair direitos que já foram conquistados anteriormente. Dessa forma, a constituição tem que evoluir e não retroceder. Nessa limitação existe a cláusula de “PROIBIÇÃO DO RETROCESSO”, conhecido como efeito cliquet;

III – Heterônomas = são aquelas que dizem respeito a outras ordens jurídicas (direito internacional). Na Europa é extremamente importante essa regra.

3.2.1.3. Tipos de Poder Constituinte Originário.

a – Material = é o sentimento de elaborar uma nova constituição;

b – Formal = é aquele que se exterioriza por meio de um procedimento que tem como objetivo elaborar uma constituição. O formal é limitado pelo natural, porquanto não pode desvirtuar as idéias expostas pelo poder constituinte originário material. Sendo assim, o formal é instrumento do material.

OBS: no espaço de tempo entre os tipos de poder constituinte originário há a criação, pela Assembléia Nacional Constituinte, de uma constituição provisória para reger as relações que forem criadas entre o poder constituinte originário material e formal. Ex.: Decreto n. 1 de 1899.

c – Histórico = a primeira constituição do Estado;

d – Revolucionário = todas as demais posteriores do Estado.

3.2.1.4. Efeitos de uma nova Constituição na ordem jurídica passada.

Há um duplo aspecto: a) em ralação a constituição anterior;

b) normas infraconstitucionais anteriores.

I – Em relação a constituição anterior, temos duas teorias:

a – Comparar as normas da constituição antiga com a constituição nova e aquilo que for compatível com a nova constituição seria aproveitado, no entanto, não mais com status de norma constitucional, mas sim infraconstitucional. Esse processo é chamado de “Teoria da Desconstitucionalização” e o que não for compatível há simples revogação.

OBS: vale salientar que a Teoria da Desconstitucionalização não é aceita pelo STF.

b – A corrente aceita pela doutrina e jurisprudência caminha no sentido de que a nova constituição revoga a constituição anterior. A constituição anterior é totalmente revogada pela nova constituição, ou seja, há uma completa ab-revogação.

OBS: há de se salientar que o poder constituinte originário, em virtude de sua ilimitação, pode aproveitar norma constitucional anterior, desde que seja de forma expressa, seja como norma infraconstitucional seja como norma constitucional. No silêncio do poder constituinte originário aplica-se a regra geral, qual seja: há revogação total da constituição anterior.

II – Normas infraconstitucionais anteriores.

Aqui não prevalece a ideia de total revogação da lei anterior, mas sim de aproveitamento, desde que a lei anterior infraconstitucional preencha certos requisitos, havendo um verdadeiro fenômeno chamado RECEPÇÃO.

O critério mais importante para o fenômeno da recepção é a compatibilidade material. Ou seja, o conteúdo da lei infraconstitucional anterior precisa ser compatível com a nova constituição. A forma da lei anterior não possui qualquer relevância com o fenômeno da recepção.

OBS: se a lei anterior for compatível materialmente com a nova constituição, mas for incompatível com a constituição anterior revogada, a qual estava em vigor quando da criação da lei anterior, não haverá a recepção, porquanto para este fenômeno há necessidade de a lei anterior não ser inconstitucional, ou seja, a lei anterior precisa ser constitucional, tanto do ponto do vista formal como material com a constituição anterior.

OBS: Se a lei anterior não for compatível com a nova constituição há duas correntes:

a – Inconstitucionalidade superveniente. Não é adotada pelo STF, porque a constitucionalidade da norma tem como parâmetro tão somente a constituição em vigor no momento da elaboração da lei;

b – Quando não há a compatibilidade material há a revogação da lei anterior. Tese adotada pelo STF.

OBS: No fenômeno da recepção, há a análise de item por item. Ou seja, todas as normas da lei anterior são analisadas por completo. Sendo assim, pode existir a recepção de apenas parte de uma lei anterior que é compatível com a nova constituição.

OBS: E qual o status da recepção da lei anterior?

A nova constituição é quem vai dizer o status da lei anterior que será recepcionada pela nova ordem constitucional. Ex.: O atual Código Tributário Nacional.

3.2.2. Poder Constituinte Derivado (2º Grau)

É o poder de promover alterações em normas de uma constituição já existente. Para alguns autores, entretanto, seria sequer um poder constituinte, sendo mera competência reformadora da constituição.

3.2.2.1.Características.

I – Natureza:

a – Poder jurídico = o seu fundamento de validade repousa em norma jurídica (constituição);

b – Posterior;

c – Condicionado = quanto a sua forma de expressão;

d – Subordinado;

e – Limitado juridicamente.

3.2.2.2. Tipos de Poder Constituinte Derivado.

I – Reforma.

O objetivo é promover alterações formais no texto da constituição. Previsão está no art. 60, da CF.

OBS: Limitações jurídicas expressas do Poder Derivado de Reforma.

I – Procedimentais ou formais = dizem respeito ao procedimento de alteração da constituição.

a – iniciativa;

b – quanto à aprovação = dois turnos de votação, com o quorum de votação de 3/5 dos membros de cada casa;

c – quanto à promulgação;

d – quanto à rejeição (princípio da irrepetibilidade).

II – Circunstanciais.

a – intervenção federal;

b – estado de defesa;

c – estado de sítio.

III – Temporal.

A atual constituição brasileira de 88 não prevê essa limitação. Apenas a constituição brasileira de 1824.

IV – Materiais.

As limitações materiais atinem a elementos que compõem a própria estrutura jurídica do Estado. Tais são elementos são apontados como alicerces imprescindíveis para qualquer ordenamento jurídico que possua uma constituição. No Estado brasileiro, tais elementos estão previstos no §4º, do art. 60 da CF/88: a Federação (forma de Estado), Separação dos Poderes (princípio fundamental da República Federativa do Brasil), Direitos e Garantias Individuais e o Voto direto, secreto, universal e periódico.

ATENÇÃO: O voto obrigatório não é cláusula pétrea.

Obs: Limitações Jurídicas ao Poder Derivado de Reforma Implícitas:

I – Titularidade do Poder Constituinte = sempre o povo, tanto o Poder Originário como o Derivado;

II – A forma republicana de governo;

III – As próprias limitações expressas não podem ser alteradas.

Obs: DUPLA REVISÃO.

A dupla revisão significa a possibilidade de um EC poder retirar uma limitação expressa do texto constitucional e modificar a matéria que era tratada pela limitação expressa. Há de se salientar, entretanto, que a dupla revisão não é aceita pelo ordenamento brasileiro.

II – Poder Derivado de Revisão.

Está previsto no art. 3º da ADCT: a revisão constitucional será realizada após 5 anos da promulgação da constituição pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional em sessão unicameral. Sendo assim, temos:

I – após 5 (cinco) anos da promulgação da CF/88;

II – maioria absoluta;

III – sessão unicameral do congresso nacional.

Obs: hoje não seria mais possível criar outro procedimento de revisão, mesmo com a criação de regra na própria constituição, porque há limitação de ordem material implícita, ofendendo, assim, o art. 60, da CF.

Obs: na revisão constitucional há a observância de certas limitações, entre as quais temos:

I – circunstanciais;

II – material.

III – Poder Derivado Difuso.

Alteração da constituição sem alteração formal do texto constitucional. Ou seja, há modificação da norma sem alteração ou consideração do próprio procedimento de reforma.

Obs: a norma é formada pelos seguintes componentes:

NORMA = TEXTO + ATIV. INTERPRETATIVA

Sendo assim, quando há modificação no texto há manifestação do poder de reforma. Agora, quando há modificação da atividade interpretativa há atuação do poder derivado difuso.

Ademais, com o poder derivado difuso, ocorre o fenômeno chamado pela doutrina de “Mutação Constitucional”, o qual ocorre quando há alteração da norma em razão de mudanças sociais, econômicas e políticas em um Estado sem que haja alteração no respectivo texto. Há uma verdadeira mudança silenciosa do texto constitucional. Titulares:

a – Reforma = Congresso Nacional (o povo);

b – Difuso = o povo, mas quem o exerce é o judiciário, com preponderância do STF. Aqui a regra é para países que adotam o controle jurisdicional de constitucionalidade.

3.2.2.3. Poder Derivado Decorrente.

É considerado como um poder a parte. Mas na verdade é um poder que deriva do poder originário. Sendo assim, é o poder que os Estados membros possuem de se auto-organizarem por meio de suas próprias constituições. Em regra, a ideia de um poder derivado decorrente somente existe nos Estados que adotam a forma federativa de organização. Há de se salientar, outrossim, que o poder derivado decorrente encontra certas limitações, entre as quais:

I – Estabelecidas = são aquelas que a CF impõe de modo expresso ou tácito e são resultantes de uma interpretação dada ao texto constitucional. Ex.: duração do mandato do governador, que será de 4 anos. Há duas espécies de princípios estabelecidos:

a – Impositivo (mandatário) = conduta que o Estado-membro tem que obedecer. Ex.: duração do mandato do governador.

b – Vedatória = proíbe determinada conduta do Estado-membro.

Ex.: art. 25, §2º, da CF, vedação de exploração de gás canalizado por MP.

II – Sensível = são aquelas que quando despeitadas dão ensejo a uma intervenção federal. Estão previstas no art. 34, inciso VII, da CF.

III – Extensíveis = são aqueles que a CF prevê a sua aplicação na esfera federal, porém em razão do princípio da simetria resultante do pacto federativo são aplicáveis também no âmbito estadual.

Ex.: norma de organização, como o processo legislativo.

Obs: normalmente, tudo o que concerne a Separação dos Poderes é um princípio extensível aos demais entes federativos.

OBS: No que concerne aos Municípios brasileiros, temos as seguintes observações:

I – Possuem uma Lei Orgânica (constituição municipal)

a – aprovada = pela Câmara Municipal

b – quorum = 2/3 dos membros

c – intervalo = em 2 turnos (mínimo de 10 dias)

d – promulgada pela Câmera Municipal.

II – O Município pode exercer o poder derivado decorrente?

Os Municípios não exercem o poder derivado decorrente, apenas os Estados-membros. Alguns doutrinadores consideram que são poderes derivado do derivado, porque há uma limitação tanto da CF como da CE.

OBS: O Distrito Federal exerce o poder derivado decorrente?

O procedimento de aprovação da LO é o mesmo do art. 29, da CF, sendo observado os princípios da própria CF. Sendo assim, o DF também exerce o poder derivado decorrente. Há de se fazer uma pequenas ressalva: pelo critério jurídico-formal, o DF não exerce o poder derivado decorrente, porque se leva em conta apenas a formalidade, ou seja, a LO.

3.2.2.3. Poder Constituinte Supranacional.

A elaboração de uma constituição que abrangeria mais de um Estado soberano.

Obs: o poder constituinte supranacional não se confunde com o direito interno e nem com o direito internacional, já que o poder supranacional é superior a ambos os direitos.

Material cedido pelo professor auxiliar Pablo Francesco

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