A leitura hoje se faz necessária para todos que não ainda não estão familiarizado com o processo e seus ritos. É hora de conhecer as Partes e fazer do dos concursos apenas parte do nosso sucesso.
PARTES
01 – Conceito de Partes
Existem dois conceitos de partes, um deles menos abrangente e mais tradicional que diz ser parte aquele que faz um pedido ou tem contra si um pedido formulado, e outro, mais amplo, que diz serem partes todas aquelas pessoas que participam do contraditório.
Cândido Rangel Dinamarco e Alexandre Freitas Câmara ao analisarem o conceito de partes adotam uma distinção entre partes da demanda, que coincidiria com o conceito restrito de partes, e partes do processo, que corresponderia ao conceito mais abrangente, englobando, por exemplo, terceiros que interviessem como assistentes ou a intervenção do Ministério Público como custos legis.
Observe-se, ainda, como salienta Fredie Didier Jr., que não se pode confundir os conceitos de partes da demanda ou de partes do processo com o conceito de parte material do litígio, isso porque em virtude da possibilidade de legitimação extraordinária, nas hipóteses previstas em lei, nem sempre será o titular do direito que ira ingressar em juízo para defendê-lo.
02 – Atos das Partes
Os atos das partes, em regra, produzem efeitos imediatos, exceto a desistência da ação que produz efeitos apenas depois de homologada pelo juiz, consoante o art. 158 do CPC e seu parágrafo único.
Apenas a desistência da ação necessita de homologação, diferentemente do que acontece com a desistência do recurso que prescinde de homologação pelo magistrado. De forma que a desistência da ação pode ser objeto de retratação, um vez que enquanto não homologada a desistência pelo juiz a parte pode voltar atrás.
Os atos das partes podem ser unilaterais ou bilaterais. Os atos unilaterais são aqueles que são praticados independentemente de concordância da outra parte. A maioria dos atos processuais pratica-se unilateralmente.
Os atos bilaterais são aqueles em que a parte que os exerce precisa da concordância da outra (ex.: suspensão do processo por convenção das partes – art. 265, II, do CPC). Existem também aqueles atos que são unilaterais, mas podem se tornar bilaterais (ex.: o autor pode mudar o pedido ou a causa de pedir, mas se o réu for citado essa mudança precisará da concordância deste).
A desistência trata-se de ato unilateral até a contestação do réu. Para que o réu tenha que concordar com a desistência, ele precisa já ter contestado. Se ele ainda não contestou ou se ele é revel, o autor não precisará da sua concordância (art. 267, §4º, do CPC).
A necessidade de concordância do réu se deve ao fato de que não é só o autor que tem direito a uma sentença de mérito, o réu também tem, porém é necessário que haja fundamentação na discordância do réu, pois, do contrário, a resistência deste à desistência da ação poderia ser considerada como abuso de direito.
Observe-se ainda que se o réu for revel, o autor não precisará da sua concordância para desistir da ação. O entendimento é de que o réu só precisa se manifestar se ele tiver contestado.
Para o STJ, se o autor abandona o processo, também é necessário que o réu se manifeste, pois o réu tem direito a uma sentença de mérito. A Súmula 240 do STJ diz que o juiz não deve reconhecer o abandono de ofício, é preciso que o réu requeira. Uma vez havendo o requerimento do réu, o juiz tem que intimar pessoalmente o autor, que após a intimação terá o prazo de 48 horas para manifestar interesse no prosseguimento do feito. Não se manifestando, o processo será extinto sem resolução do mérito.
Oportunamente, ressalte-se que, segundo o art. 253, II, do CPC, se o processo for extinto sem resolução do mérito (não importa o motivo), se o autor quiser propor de novo a mesma ação, tem que ser no mesmo juízo. O citado dispositivo estabelece que, se o sujeito propõe ação idêntica, essa ação terá que ir para o juízo prevento. O citado dispositivo visa evitar a escolha do juiz pelo autor.
03 – Estabilização das Partes da Demanda (Estabilização Subjetiva)
Os elementos da ação se estabilizam com a citação, não podendo ser alterados. Com a concordância do réu, entretanto, desde que ainda não saneado o processo, é possível a alteração dos elementos objetivos da demanda, ou seja, a alteração da causa de pedir e do pedido.
No que toca à alteração subjetiva da demanda (substituição das partes) se o réu ainda não foi citado, as partes podem ser alteradas, mas se já houve citação, as partes não podem mais ser alteradas, salvo as substituições permitidas por lei.
Por oportuno, ressaltamos uma observação realizada por vários doutrinadores, de que não se pode confundir a substituição das partes em função da alteração subjetiva da demanda, com a substituição processual que decorre da legitimação extraordinária. Muitos autores, inclusive, tentando superar esta confusão terminológica, propõem usar o vocábulo “sucessão”, ao invés de “substituição”, ao se referir à alteração subjetiva da demanda.
São três as hipóteses em que a lei permite a “substituição” (sucessão) das partes após feita a citação: a) no caso de nomeação à autoria, em que há a extromissão do réu para que haja a intromissão de terceiro; b) no caso de sucessão mortis causa (art. 43 do CPC); c) no caso de sucessão inter vivos (art. 42 do CPC). Analisaremos a seguir as duas últimas hipóteses, quanto a nomeação à autoria, remetemos o leitor ao estudo das formas de intervenção de terceiro.
A sucessão mortis causa se dá com a morte da parte. Diante da morte ou perde sua capacidade processual da parte ou do seu representante legal, o processo deve ser suspenso (inc. I do art. 265 do CPC). Entretanto, se já iniciada a audiência de instrução e julgamento caberá ao advogado continuar no processo (a melhor doutrina aponta que o advogado neste caso atua como curador especial), ficando o processo suspenso a partir da publicação da sentença ou do acórdão (§1º do art. 265 do CPC).
Com a morte da parte pode surgir dúvida quanto ao momento da suspensão do processo, existindo autores, como Alexandre Freitas Câmara, que defendem que a suspensão se dá desde o momento da morte da parte, já outros autores, a exemplo de Moacir Amaral dos Santos, defendem que a suspensão se dá a partir do momento em que o juiz toma ciência da morte da parte, existindo, ainda, quem sustente que a suspensão processual deveria ser analisada caso a caso, só devendo ser suspenso o processo caso coubesse ao falecido a prática de algum ato ou o exercício de alguma prerrogativa.
O art. 43 do CPC diz que havendo morte das partes ela vai ser sucedida pelos seus herdeiros ou pelo seu espolio (se já houver). Se o direito discutido no processo for um direito intransmissível (direito personalíssimo), a morte da parte causa a extinção do processo (art. 267, IX, do CPC).
Observação
Obs.¹: Suspender o processo é diferente de suspender o prazo. Nem sempre que o processo é suspenso o mesmo acontece com o prazo. Pelo art. 180 do CPC, o processo quando suspenso só gera suspensão dos prazos quando houver morte ou perda de capacidade da parte, do seu procurador ou do representante legal ou quando for ajuizada exceção de incompetência, impedimento ou suspeição.
Obs.²: Alexandre Freitas Câmara defende que o processo não se suspende em função da morte do representante legal da pessoa jurídica ou mesmo em face da extinção desta. Segundo o referido autor, morto o representante, o processo não ficaria suspenso porque o representante afigura-se como mero órgão da pessoa jurídica, de forma que morto um representante outro, ato contínuo, assumiria. Já no que se refere a extinção da pessoa jurídica, salienta o citado professor que “a extinção da pessoa jurídica não faz com que desapareça a possibilidade de tutela dos seus interesses ainda pendentes de solução por via judicial (ao contrário da pessoa natural, que com a morte ou perda da capacidade se acha privada da capacidade de compreensão), havendo alguém que represente tais interesses (como liquidante). Por esta razão, parece melhor entender que a extinção da personalidade jurídica não acarreta a suspensão do processo.”
Obs.³: Ainda no que toca a alteração subjetiva, quando a parte for pessoa jurídica, Humberto Theodoro Júnior argumenta que “não se pode considerar substituição de parte a que decorre de alteração estatutária de pessoas jurídicas, com admissão de novos sócios e modificação de denominação social, nem tampouco as provenientes de fusão ou incorporação de pessoas jurídicas, por não se tratar de transmissão a título particular, nos termos de que fala art. 42, caput”.
A sucessão inter vivos está prevista no art. 42 do CPC. Segundo o referido dispositivo a alienação da coisa ou do direito litigioso, por ato entre vivos, não tem o condão de alterar a legitimidade das partes, porém pode o adquirente ou cessionário, substituir o alienante no processo, desde que com o consentimento da parte contrária.
Não obstante, mesmo sem o consentimento da parte contrária, poderá o adquirente ou o cessionário intervir no processo para assistir o alienante ou cedente. Sendo importante ressaltar que havendo ou não a substituição inter vivos, intervindo ou não como assistentes, de qualquer forma, a sentença estenderá seus efeitos aos adquirentes ou cessionários que adquiram bem ou direito litigioso (art. 42, §3º).
Observação
É importante observar que se A propôs ação contra B, postulando o bem X, enquanto B não for citado, o referido bem não é litigioso. Se antes de ser citado, B vendeu o bem X, ele será parte ilegítima. Já se B alienou o bem depois de ser citado, ele continuará a ser parte legítima, mas C (adquirente) será atingido pela solução dada ao processo que envolve A e B.
04 – Faculdade, Ônus e Deveres das Partes
Faculdade, ônus e dever são realidades distintas. A faculdade ocorre quando a pessoa pode ou não fazer o ato, a ausência do ato não causa nenhum problema. No caso do dever, se a parte não cumpre o ato ela pode ser forçada ou compelida a fazê-lo, sofrendo uma sanção. Já no caso do ônus, a parte não pode ser forçada a praticar o ato, não sofrendo sanções, porém sujeita-se a uma posição jurídica de desvantagem.
Observe-se ainda que no dever, se o ato não é praticado o prejuízo é suportado pela parte contrária. No ônus, se o ato não é praticado é a própria parte que se prejudica. Por exemplo, as partes não tem o dever de contestar, de recorrer, de excepcionar o juízo, de produzir provas, estes atos são ônus das partes, pois se a parte não recorre ou é revel, por exemplo, acaba por prejudicar a si mesma.
Assim, os atos das partes decorrem de ônus e não de deveres. Mas isso não quer dizer que não haja deveres no processo. Os deveres estão no art. 14 do CPC, todos decorrentes do dever de lealdade e boa-fé.
Vale observar que dois deveres, previstos no inc. V, do art. 14, despontam como de grande relevância. Consoante o referido dispositivo, as partes devem cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embargos à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final.
O descumprimento dos referidos deveres, consoante o art. 14, § único, implica em sanção, que consiste em multa de até 20% do valor da causa. Ressalte-se que a referida sanção é aplicada contra as partes e não contra os advogados, uma vez que estes se sujeitam exclusivamente ao Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.
Em face da confusa redação do § único do art. 14 da CPC, mormente da ressalva feita ao final do citado dispositivo, alguns entendiam que somente os advogados privados não responderiam pela sanção prevista no citado dispositivo, aplicando-se a multa aos advogados públicos que não se sujeitam exclusivamente ao Estatuto da OAB, sujeitando-se também ao estatuto dos servidores públicos.
O STF então na ADI nº 2.625/DF deu interpretação conforme a constituição ao parágrafo único do art. 14, não mais restando dúvida quanto à igual aplicação do citado dispositivo, tanto aos advogados privados, quanto aos públicos.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. IMPUGNAÇÃO AO PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 14 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, NA REDAÇÁO DADA PELA LEI 10358/2001. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. 1. Impugnação ao parágrafo único do artigo 14 do Código de Processo Civil, na parte em que ressalva “os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB” da imposição de multa por obstrução à Justiça. Discriminação em relação aos advogados vinculados a entes estatais, que estão submetidos a regime estatutário próprio da entidade. Violação ao princípio da isonomia e ao da inviolabilidade no exercício da profissão. Interpretação adequada, para afastar o injustificado discrímen. 2. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente para, sem redução de texto, dar interpretação ao parágrafo único do artigo 14 do Código de Processo Civil conforme a Constituição Federal e declarar que a ressalva contida na parte inicial desse artigo alcança todos os advogados, com esse título atuando em juízo, independentemente de estarem sujeitos também a outros regimes jurídicos.
Além do art. 14, o art. 18 do CPC tipifica condutas de improbidade e de litigância de má-fé, que geram uma multa de até 1% do valor da causa. Essa multa pode ser cumulada com a multa do art. 14, pois tem naturezas diferentes, bem como credores distintos.
O credor da multa do art. 18 é a parte contrária (art. 35 do CPC). Já no que se refere à multa do art. 14, se o processo tramita na Justiça Federal ou na Justiça do Trabalho, é revertida a favor da União, por outro lado, se o processo tramita na Justiça Estadual, a multa deverá ser paga ao respectivo Estado da federação.
Isso porque a parte atentou contra a jurisdição (contempt of court), e não contra a parte contraposta, sendo a referida multa cobrada por execução fiscal, após o trânsito em julgado da sentença de mérito.
Observe-se ainda que, segundo a jurisprudência, o agente público (pessoa física) que praticar ato atentatório ao exercício da jurisdição deve arcar com a multa prevista pelo art. 14 do CPC.
Tal entendimento resolve qualquer problema que possa surgir caso, por exemplo, um agente público da União pratique ato atentatório ao exercício da jurisdição em um processo que tramite perante a Justiça Federal, não havendo, assim, confusão de credor e devedor na mesma pessoa.
No caso citado, o responsável pela multa será o agente e a não a União, que será a credora da referida multa. Neste sentido vide o REsp 666008/RJ, julgado pela Primeira Turma do STJ, DJ 28/03/2005, ou ainda, com maior clareza, o acórdão abaixo transcrito proveniente da Terceira Turma do TRF da 1ª Região, prolatado no julgamento do Agravo de Instrumento nº 200701000221766.
PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO. EMISSÃO DE TDA’S COMPLEMENTARES. NÃO CUMPRIMENTO DA ORDEM. MULTA PROCESSUAL CONTRA PRESIDENTE DO INCRA. POSSIBILIDADE. CONTEMPT OF COURT. BLOQUEIO DA EMISSÃO DE TÍTULOS PARA NOVAS DESAPROPRIAÇÕES. IMPOSSIBILIDADE. MULTA POR DESCUMPRIMENTO IMOTIVADO DE ORDEM JUDICIAL. POSSIBILIDADE. 1. Não excede os limites da legalidade a imposição da multa processual, de que trata o art. 14 do CPC, contra o Presidente do INCRA, pois a norma não excetua as pessoas que tenham responsabilidade para o cumprimento da ordem judicial, sobretudo quando esta ordem, que se encontra expedida há mais de 03 (três) anos, com reiteração de ordem de cumprimento ao longo desse tempo, é descumprida injustificadamente, num ato atentatório ao exercício da jurisdição e à autoridade judicial. Aplicação do instituto do contempt of court. 2. Por outro lado, não pode a decisão judicial bloquear a emissão de novos títulos, dirigidos a outras desapropriações, na medida em que se trata de ato gravoso que atinge interesse de terceiros. 3. Na hipótese de descumprimento de ordem judicial, deve o magistrado prolator da ordem, comunicar o fato ao Ministério Público ou à autoridade policial para as providências penais cabíveis, não estando na sua esfera jurisdicional a decretação da prisão. Precedentes do Tribunal. 4. Agravo de instrumento provido em parte.
Material cedido pelo professor auxiliar Thiago Arraes
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